Eu estava em casa, deitado em minha cama, olhando para o céu azul límpido através da janela, quando notei alguns zumbidos furtivos passando por mim. Eram abelhas invadindo a casa pelas fenestrações da janela. Não muitas, dava pra contar nos dedos. Certamente queriam roubar açúcar na cozinha. Continuei deitado. No entanto, aquilo me deu uma ideia. Peguei caneta, papel, e o violão. Rabisquei algo até interessante.
Alguns dias depois...
Liguei pra João.
- Fala João. Tudo bem, meu amigo?
- Oi meu amigo. Mais ou menos, né. Estou no México para gravar um disco, talvez demore alguns meses até sair. Já estou sentindo falta de feijão, arroz e farinha.
- Não se come bem no México?
- Até que sim, entre burritos e tacos a gente vai enchendo o buxo. Mas gosto demais de feijão.
- Entendo, é realmente difícil ficar muito tempo sem comer o que a gente gosta. A propósito, João, estou fazendo uma música, um samba, queria uma opinião sua.
- Ótimo. E como está o andamento? Já tem a melodia?
- Estou compondo aos poucos. Tô pensando nela para pôr no disco novo, sabe como é, qualquer luz de inspiração tem que ser aproveitada.
- E fala de que?
- Abelhas.
- Sim, e o que mais? Abelhas como? Ecologia, mel, picada, zum-zum-zum? Zum-zum-zum é samba.
- Por aí. “Talvez – cantarolei – pelo buraquinho invadiu-me a casa, me acordou na cama, tomou o meu coração e sentou na minha mão...”
- Que coisa linda. Por coincidência, eu estava falando com o Capinan, e ele lembrava que a abelha beija a flor e faz o mel. Eu gostei e completei: E ainda faz zum-zum.
- Posso usar isso?
- Deve.
- Obrigado, João. O tom está em ré, tá ficando um balanço bonito, quase bossa nova.
- Sabe, Luis, me lembrei que outro dia a Bebel estava brincando aqui na rua, quando levou uma pancada. Eu tentei acudi-la, mas ela só dizia: “acabou chorare, acabou chorare”.
Dei uma boa risada. Chorare é demais.
- João, a Bebel é uma exímia poetisa, adorei esse neologismo. Posso pôr na letra também? Prometo que ela vai participar como compositora.
João riu.
- Claro que pode. Só assim pra gente celebrar a vida em tempos tão penosos.
- Obrigado, meu amigo.
“Acabou chorare, ficou tudo lindo... de manhã cedinho...”
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