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Foto do escritorA coruja

As canções de senhorinha


Não há palavras que descrevam o quanto eu te amei. E vou te amar. A casa de vovó agora ficará vazia, pois você não vai estar mais lá. Fará falta a voz inconfundível da cantora mais talentosa que eu pude ouvir, não perdia o tom.


As canções memoráveis, que todos nós aprendemos:


“Canta vagabundo

Na sua desilusão

Canta a sua mágoa pelo mundo

Faz da sua dor uma canção

Pra que chorar, pra que, pra que?

Se o teu pranto ninguém vê

Chora por alguém que não te quer

Faz da tua dor uma mulher”


“Eu chorei, chorei mas sem querer chorar

Ô abre alas, ô abre alas,

Deixa o capela passar...”


“Tenho saudade de Laura

Daquela Laura amorosa...

Daquele céu de estrelas,

Daquela tarde saudosa...”


“Ó que tristeza, eu sinto agora

Em minha vida

Eu ver sua boca, unida assim,

Em outra boca

Eu ver teu corpo

Unido assim em outros braços

Longe de ti, por que o ciúme, é meu fracasso

Mas se quiser, voltar pra mim,

Ainda te quero...”


“Vivo só sem você,

Eu não posso esquecer

Um momento sequer...

Vivo pobre de amor,

À espera de alguém

Esse alguém não me quer

Vejo o tempo passar

O inverno chegar

Só não vejo você

Se outro amor em meu quarto bater

Eu não vou atender”


“Deixa chover, ô deixa molhar

Que ainda no molhado é melhor de se brincar

O guarda-chuva, que eu acho graça

Guarda chuva de pobre é cachaça

Se a chuva cai, ô me sinto bem

Molha por fora e por dentro também”


E assim ia, de canção em canção, encantando a todos que paravam pra lhe ouvir. Adorava ouvir uma sanfona, fumar um cigarrinho de palha, e estar ali, na roça, pra sempre. Ela amava tanto aquele lugar, aquele pedacinho de terra rodeado de mato e de frente pra o cruzeiro onde tantas rezas foram feitas. Pois ela era sobretudo uma mulher de fé.


Não dá pra lembrar de você, vovó, sem lembrar das suas canções, do seu sorriso fácil, do seu amor à natureza, do seu cigarrinho, da sua insistência pra que a gente pudesse comer mais, mesmo se já estivéssemos de barriga cheia. Apenas a sua lembrança é capaz nos alegrar, e a tristeza de perdê-la não será maior do que a lição que você nos ensinou, que foi o amor.


In memoriam


25/12/1930 – 18/06/2021

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