Não sei você, leitor(a), mas muito me parece que estamos vivendo em tempos estranhos. Não isoladamente, como se fosse um episódio de uma longa história, mas é a própria: longilínea, permeada pelo tempo. Imagine um stop motion, uma sequência de fotografias que formam um filme. Mas a que me refiro, afinal? À fotografia do momento. Tem-se percebido, principalmente nos ambientes virtuais, uma virulência odiosa sem precedentes. Por causa de política, as pessoas estão insultando, ameaçando e esbravejando como cães raivosos a defender sua ninhada ou comida. Eu poderia ser bastante simplório e revelar de uma vez que os maiores propagadores desse ódio virtual (que claramente pode se desdobrar numa violência física ou psicológica) são uma parcela dos eleitores de Jair Bolsonaro. Mas é justamente isso: não é tão simples. É ser eleitor do dito cujo que os converte à “filosofia” da intolerância à opinião contrária? Creio que não, amigo(a) leitor(a).
Vejamos. Se a campanha presidencial dele tem mobilizado massas Brasil afora, a campanha contrária também está extremamente forte. Entre os candidatos, é o mais rejeitado (mais de 40% do eleitorado não votaria nele). Sua rejeição vence em primeiro turno. Daí a sociedade inicia (com o pioneirismo das mulheres) uma ampla mobilização de caráter pacífico contra as idéias que o tal “Coiso” representa, e surge uma hashtag que vai entrar pra história do Brasil, a #Elenão. Um grupo é criado no facebook, “Mulheres contra Bolsonaro”, e reúne cerca de 3 milhões de pessoas em torno de uma causa comum, que urge como válvula de escape ao fascismo institucional com o qual tem flertado boa parte do eleitorado brasileiro.
É diante desse cenário que a intolerância tem tomado proporções cada vez maiores, e creio que você também está percebendo isso. Não demorou muito, e o grupo foi hackeado, tendo o nome editado para "Mulheres com Bolsonaro". Não bastasse isso, hoje (25/09) alguns sites de notícia informaram que uma das organizadoras do referido grupo de mulheres sofreu agressões físicas no Rio e teve o celular roubado. Estranho, não? A polícia está investigando o caso, mas os indícios são muito fortes de que foi algo orquestrado pela militância fascista, ou pelo próprio grupo político de Bolsonaro, que flerta com a milícia e com a repressão violenta. Nas redes, artistas que têm se posicionado contra o deputado e que estão aderindo à hashtag estão sofrendo toda espécie de insulto e xingamento, beirando à ameaça. A cantora Marília Mendonça (que fez um post recente e depois o apagou), por exemplo, disse que não apenas ela recebeu mensagens de ódio, como a própria família.
No entanto, os intolerantes e fascistóides, acredito, não o são por causa do candidato A ou B. Na realidade já são pessoas amargas, desiludidas com a política, revoltadas com o petismo (e uma generalização estúpida que fazem da Esquerda) que encontram em Jair Bolsonaro o espelho daquilo que elas sentem. Ele encarna essa revolta. Mas revolta sem causa vai se resumir a um ódio sem sentido. Numa busca por alternativa (vale lembrar, legítima) à atual forma de fazer política no Brasil - cimentada na corrupção e no toma lá da cá - pode-se acabar caindo num mero fogo cruzado cujo objetivo é só o poder pelo poder, porque ninguém vai me convencer que um cara que é deputado federal a 28 anos, improdutivo e afim à Ditadura e seus torturadores, é proposta de renovação. Não é mesmo.
Mas Carl Sagan estava certo quando disse que não é possível convencer um fanático de coisa alguma, pois o que o move é uma profunda necessidade de acreditar. E muitos vão reproduzir isso com violência, como fizeram as Cruzadas na Idade Média. Dia 29 vai haver o Ato das Mulheres contra Bolsonaro, por todo o Brasil. Que no fim, vai ser um um grande movimento contra a intolerância, o machismo e toda forma de discriminação social e racial.
Segurança redobrada, pois os tempos de fato são estranhos.
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