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  • Foto do escritorA coruja

educação no sertão - uma conquista possível




O modelo educacional brasileiro atual vai muito mal. Em 2019, a evasão escolar geral foi de 7,6%, e no Norte-Nordeste de 9,2%. Entre os jovens pertencentes a famílias de baixa renda, o índice foi ainda maior: 11,8% deles não concluíram o ensino médio em 2018, em contraste com apenas 1,4% entre os jovens mais ricos. O atraso escolar também atinge as classes sociais mais baixas com maior peso, sendo de 1/3.


Em termos de salários de professores, o Brasil também vai mal. É o país que paga o menor piso inicial para professores do ensino fundamental e médio entre os países da OCDE. A título de exemplo, enquanto o Brasil pagava 13.971 dólares/ano (cerca de 3,8 mil reais por mês, variando para menos ou para mais a depender da região), o Chile pagava US$ 23.429/ano. Os municípios brasileiros, apesar de terem, em geral, plano de carreira para magistério, em sua maioria não tem tal plano para o pessoal dos serviços gerais e de apoio escolar. Além disso, a maioria (cerca de 70%) ainda recorre à indicação política para nomear gestores escolares, algo que deveria mudar.


A escola pública e seu currículo precisam ser debatidos com maior profundidade. O fato é que o atual modelo pedagógico, emperrado no enciclopedismo do século XIX, não prende a atenção do aluno e o engessa ao exigir dele somente a decoreba de sempre.


Nesse contexto, existe um modelo, no país, que tem recebido a atenção não só dos especialistas brasileiros em educação, mas também fora das fronteiras nacionais. É o de Sobral-CE. Esta cidade, encravada no sertão cearense, alcançou a proeza de ser detentora do melhor Ideb (índice de desenvolvimento da educação básica) entre todas as cidades brasileiras, de 9,1, além de ter conseguido zerar a evasão escolar do 1º ao 5º ano do ensino fundamental.


Essa conquista tão relevante de Sobral, evidentemente, não foi conseguida do dia pra noite. A cidade de 210 mil habitantes do interior do Ceará passou por uma transição política no ano de 1997, e nesse ínterim as gestões que vieram e se sucederam de lá para cá deram maior visibilidade e importância ao tema da educação, tratando dela com zelo e implantando políticas municipais de longo prazo. No princípio foram notados altos índices de analfabetismo escolar – quando a criança passa pelas séries mas não adquire a leitura e capacidade de interpretação dos textos.


A gestão municipal de então, tendo Cid Gomes como prefeito, inicialmente fez parcerias com o Instituto Ayrton Senna, que permitiu uma ampla formação e reciclagem inicial de professores e gestores escolares.


O programa de alfabetização sobralense foi ganhando destaque se estendeu por todo o Ceará.


O compromisso da educação pública e de tempo integral como política de Estado e de governo também foi importante – assim, foi necessária a iniciativa dos agentes públicos interessados em promover essa mudança impactante para que ela acontecesse.


O atual secretário de educação de Sobral, o físico e professor da UFC Herbert Lima, destaca que a cidade tem três pilares que fundamentam sua política educacional:


1. Fortalecimento da gestão escolar. Diretores e coordenadores não são nomeados por políticos, mas passam por seleção pública com prova escrita, prova de títulos, análise comportamental, experiência em sala de aula e conhecimento do campo teórico-prático em Educação.


2. Formação continuada de professores. Sobral tem uma escola de formação de professores. Todos os professores do município têm aula, um mês inteiro por ano, onde eles preparam o planejamento mensal e anual, desenvolvem atividades didático-pedagógicas e constroem recursos lúdicos para serem aplicados em sala de aula. A escola qualifica a mais de uma década todos os professores do município.


3. Política de valorização de profissionais do magistério. Está pautada da seguinte forma: em Sobral, todos os profissionais recebem, a cada 1º de janeiro, retroativamente, o piso nacional do magistério, pagos com recurso do FUNDEB. Além disso, por leis municipais, são pagas gratificações e bonificações, diretamente no contracheque dos professores, a partir dos resultados das avaliações que o município desenvolve.


Assim, reunir critérios de seleção de diretores e coordenadores escolares, de formação continuada, e uma política de incentivo e valorização dos profissionais do magistério, contribuem para o êxito sobralense na área pedagógica.


Ainda segundo Herbert Lima, Sobral valoriza e utiliza a BNCC (Base Nacional Comum Curricular) e dialoga com o governo federal, mas também adota outras práticas curriculares com base em experiências internacionais. Novos currículos para português e matemática, elaborados por consultores externos, inspirados nos modelos de países como Finlândia, Alemanha, EUA, Canadá, etc. Adoção de aulas interativas de física, química e biologia (ciências naturais) mediante uso de tecnologias que propiciem percepções construtivas da realidade. Implantação de laboratórios digitais com impressoras 3D, robótica, eletrônica, tablets, notebooks. Programação e eletrônica para abordar ciências da natureza.


O secretário destaca que é preciso levar tecnologia para dentro da escola, com adoção de ferramentas que estimulem o raciocínio lógico-matemático, programação, que trabalhem conceitos de inteligência artificial, robótica, cortadora laser, impressora 3D – e os custos não são elevados, considerando o impacto na formação desses estudantes. Aqui vale uma frase de Leonel Brizola: “a educação não é cara. Cara mesmo é a ignorância”.


Portanto, o que se busca, afinal, é um currículo mais flexível, eficiente e interativo com o cotidiano do alunado.


Dinheiro, de fato, não é o principal problema. Por exemplo: fazendo uma análise apenas a nível de receita municipal e Ideb, entre Sobral e Feira de Santana, encontraremos o seguinte resultado: enquanto o Ideb da cidade cearense é 9,1 para um PIB per capita de R$ 21.679,33 (2017), Feira possui um Ideb 4,4 para um PIB de R$ 21.765,41. Teoricamente Feira é mais rica que Sobral, mas possui uma educação básica bem menos eficiente.


É verdade que cada cidade e cada Estado possui uma realidade diferente, um contexto socioeconômico e cultural diferente, mas as realidades das cidades anteriores não são tão distintas, tendo em vista serem cidades do semiárido dos seus respectivos Estados, polos culturais, econômicos e políticos, e detentoras de um PIB per capita com diferença relativamente pequena entre eles. O problema central parece ser do engajamento político e do desenvolvimento de políticas educacionais próprias, valorizando cada vez mais a educação como forma de emancipar o ser humano oferecendo a ele mais oportunidades, e reduzindo as desigualdades existentes. Essa reflexão se estende para todas as cidades, a priori.


Levando em consideração que 2020 é um ano de eleição, mesmo numa pandemia é duvidável que não haja candidatos dispostos e com vontade de eleição. Que eles tenham como pauta, além dos demais temas não menos importantes, a educação. Para Valente, minha cidade, espero isso. Que ela se torne referência na Bahia, tal como Sobral é no Ceará. Temos capital humano para isso, o que é necessário é valorização dos profissionais e engajamento social e político para sairmos do 5,1 de Ideb e consigamos pelo menos a meta de 6,0 até 2022, ainda sem considerar os efeitos da pandemia, que certamente puxarão o índice pra baixo se não forem mitigados.

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Referências:



METAS. Inep-MEC. Disponível em <http://portal.inep.gov.br/educacao-basica/ideb/metas> Aceso em 07 de julho de 2020


IDEB. Inep-MEC. Disponível em <http://ideb.inep.gov.br/resultado/resultado/resultado.seam?cid=2709748> Acesso em 07 de julho de 2020


Produto Interno Bruto dos Municípios - 2010 a 2017» Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Consultado em 07 de julho de 2020


Entrevista com Herbert Lima (Secretário da SEDUC-Sobral) disponível em <https://www.youtube.com/watch?v=eHmCGxa6Eos>

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