Disse um democrata que a democracia é um regime de conquista, e não de concessão.
Esta afirmação tem encontrado pouco eco nos dias atuais, diante de certa deformação do processo democrático brasileiro.
A democracia, para além de ser um regime de governo que confere às pessoas a faculdade da eleição direta de seus representantes, é também uma espécie de sistema, ou contrato social, de garantia de direitos fundamentais que levam em consideração a dignidade humana.
No entanto, como tudo que é humano, a democracia está sujeita a muitas falhas. Uma delas ocorre quando a máquina pública é malversada e se converte num mecanismo de favorecimento dos seus operadores (políticos e servidores públicos). Esta situação invariavelmente se refletirá na má prestação de serviços públicos, quando não da negligência total dos problemas sociais que o poder público deveria solucionar.
Há outra falha que pode surgir bem antes: nas eleições. Quando elas ocorrem de forma muito desigual sob o ponto de vista do "acesso" ao povo. Por exemplo, quando um candidato A tem mais dinheiro que o candidato B. O candidato A investirá pesadamente em marketing, terá mais tempo de TV ou contratará empresas de disparo em massa no whatsapp. Assim, o dinheiro pode ser usado (legal ou ilegalmente) para eleger projetos de poder.
Além disso, a compra de votos ainda é uma realidade Brasil afora, principalmente em ambientes de muita pobreza e baixos níveis educacionais.
Nessas condições, a democracia, que deveria propiciar uma eleição baseada em propostas concretas que melhorem a vida do povo, será corrompida, uma vez que as pessoas serão induzidas a eleger não os representantes dos melhores projetos (pra o povo!), mas aqueles que tiverem mais poder financeiro.
Não é fácil mudar essa realidade. É só lembrar da frase inicial: a democracia é um regime de conquista. Com isso, mesmo a retomada da democracia plena (que reconhece os melhores projetos, e que reconhece a própria noção de PROJETO) e de eleições mais justas, será possível apenas por meio da conquista, que é o cerne da questão.
Essa conquista passa por muitos e variados processos. Um deles, obviamente, é a conscientização das pessoas. Mas conscientizar um homem é tarefa das mais árduas (como bem disse Mangabeira Unger: “é mais fácil mudar um país do que mudar um homem”), por isso a solução passa pela transformação do berço e da formação do ser humano: a educação. Esta sim, é a verdadeira saída. Tema dos mais importantes, e que já deveria estar sendo debatido em sociedade, por todos. Na ausência desse ambiente de debate, os assuntos mais urgentes vão sendo adiados e substituídos pelo discurso raso e sem conteúdo, na repetição cíclica do marasmo intelectual de nossos tempos.
Além disso, o papel dos partidos é essencial. Estes devem estabelecer - enquanto representantes do pensamento e das lutas na política - compromissos sérios com seu povo, aproximar as lideranças e lançar candidatos preparados e dispostos a fazerem as mudanças que a sociedade contemporânea necessita, sem demagogia. Sem replicar velhas práticas. Trazendo a bola de volta pro centro do campo, quem sabe ao menos a gente vislumbra uma mudança, ainda que pareça remota.
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